Diferença entre carência e tempo de contribuição
“Diferença entre carência e tempo de contribuição”
Conceitos que fazem parte da rotina do Advogado Previdenciarista, carência e tempo de contribuição tendem a ser tratados, muitas vezes, como sinônimos, mas apresentam diferenças fundamentais que merecem especial atenção. Neste blog, apresentaremos os pontos principais para que não restem mais dúvidas sobre o assunto.
O que é período de carência?
Conforme o art. 24, da Lei 8.213/91, “período de carência é o número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas a partir do transcurso do primeiro dia dos meses de suas competências“. Ainda, de acordo com o art. 145, da Instrução Normativa nº 77/2015, do INSS, por sua vez, “um dia de trabalho, no mês, vale como contribuição para aquele mês, para qualquer categoria de segurado, observadas as especificações relativas aos trabalhadores rurais“.
Todavia, destaca-se que não basta a existência de contribuições para que haja carência. Somente serão consideradas para este fim as contribuições realizadas desde a data do efetivo pagamento da primeira contribuição em dia, sendo desconsideradas as contribuições feitas em atraso quanto a competências anteriores, nos casos do contribuinte individual e facultativo (art. 27, II, Lei 8.213/91).
Com efeito, em se tratando de contribuições que possuem presunção de recolhimento, não há a possibilidade de recolhimento em atraso, “devendo a carência ser computada a contar do mês da filiação, independentemente do recolhimento, a saber: empregado, empregado doméstico, trabalhador avulso e contribuinte individual prestador de serviços à empresa” (AMADO, 2018, p. 19). Contudo, nos outros casos, para que conte como carência desde o primeiro recolhimento, é necessário que este tenha sido feito em dia.
No ponto, interessante destacar que este já é o posicionamento que vem sendo adotado pela Turma Nacional de Uniformização, veja-se:
PREVIDENCIÁRIO. CARÊNCIA. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. RECOLHIMENTO COM ATRASO DAS CONTRIBUIÇÕES POSTERIORES À PRIMEIRA. AUSÊNCIA DE PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DAS CONTRIBUIÇÕES ATRASADAS. 1. Devem ser consideradas, para efeito de carência quanto à obtenção do benefício de auxílio-doença, as contribuições previdenciárias recolhidas com atraso, desde que posteriores à primeira paga sem atraso. 2. A possibilidade do cômputo, para efeito de carência, dessas contribuições recolhidas em atraso decorre diretamente da interpretação do disposto no art. 27, II, da Lei nº 8.213/91. Importa, para que esse pagamento seja considerado, que não haja perda da qualidade de segurado. Precedente do STJ (REsp 642243/PR, Rel. Ministro Nilson Naves, Sexta Turma, julgado em 21/03/2006, DJ 05/06/2006 p. 324). 3. Tratando-se de restabelecimento de benefício de auxílio-doença, e considerando que a questão da capacidade da autora para o trabalho não foi devidamente apreciada nas instâncias anteriores, devem os autos retornar ao juízo de origem para que se proceda ao completo e devido julgamento. 4. Pedido de Uniformização parcialmente provido para anular o acórdão e a sentença monocrática.(200772500000920, JUIZ FEDERAL DERIVALDO DE FIGUEIREDO BEZERRA FILHO, DJ 09/02/2009.)
Existem hipóteses previstas pela IN 77/2015, porém, que preveem expressamente seis situações em que não será contabilizado período de carência, são elas:
I – o tempo de serviço militar, obrigatório ou voluntário;
II – o tempo de serviço do segurado trabalhador rural anterior à competência novembro de 1991, exceto para os benefícios do inciso I do art. 39 e caput e § 2º do art. 48, ambos da Lei nº 8.213 de 24 de julho de 1991;
III – o período de retroação da DIC e o referente à indenização de período, observado o disposto no art. 155;
IV – o período indenizado de segurado especial posterior a novembro de 1991, exceto para os benefícios devidos na forma do inciso I do art. 39 da Lei nº 8.213, de 1991; e
V – o período em que o segurado está ou esteve em gozo de auxílio-acidente ou auxílio-suplementar.
VI – o período de aviso prévio indenizado. (Incluído pela IN INSS/PRES nº 85, de 18/02/2016)
Com exceção desses casos e ocorrendo a primeira contribuição em dia, nas hipóteses acima citadas, é possível a contabilização do tempo como período de carência. Assim, para averiguar qual a carência necessária no caso concreto, é preciso que o Segurado tenha em mente qual a carência exigida para o benefício que pretende ver concedido.
São os períodos de carência:
- auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 meses;
- aposentadorias por tempo de contribuição, por idade e especial: 180 meses, devendo ser levada em conta as hipóteses de redução do art. 142, da Lei 8.213;
- auxílio-reclusão: 24 meses;
- salário-maternidade, nos casos de segurada contribuinte individual, facultativa e e especial: 10 meses.
Cumpre ressaltar, porém, que o art. 151, da Lei 8.213/91, traz expressamente as hipóteses de enfermidades em que a concessão de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez independerão de carência.
Outrossim, os períodos em gozo de benefício por incapacidade também poderão ser contabilizados para fins de carência, desde que intercalado entre atividades laborativas.
Já explicamos anteriormente o porquê uma das possíveis problemáticas que serão debatidas após a aprovação da Reforma da Previdência poderá ser o fim do conceito de carência para as aposentadorias.
O que é tempo de contribuição?
Apesar de servir como base para verificar a existência de carência ou não, o tempo de contribuição é contado de forma diferente daquela. Para ficar mais simples, imagine-se a seguinte situação: um segurado mantém vínculo empregatício com uma empresa no período de 31 de janeiro de 2019 a 05 de abril de 2019. Para fins de carência, esse segurado possui 4 meses (de janeiro a abril), mas, como tempo de contribuição, possui somente 2 meses e 6 dias.
Isso porque o tempo de contribuição corresponde exatamente ao período efetivo entre a data de início e a data de término da atividade exercida pelo Segurado da Previdência Social. Nesse sentido, essa é a razão pela qual muitas vezes a pessoa pode ter completado a carência para uma determinada aposentadoria, mas não o tempo de contribuição e vice-versa, já que um conceito é contabilizado diferentemente do outro.
Para os segurados empregados e empregados avulsos, o tempo de contribuição corresponderá ao tempo efetivamente trabalhado, independentemente de recolhimentos, pois estes são responsabilidade do empregador. Para os contribuintes individuais e facultativos, porém, o tempo de contribuição só passará a contar a partir do início dos recolhimentos para a Previdência Social, ou seja, se houver trabalho, mas não houver recolhimentos, estes segurados não terão o lapso computado para fins de tempo de contribuição.
Portanto, é possível perceber que a carência é um conceito que possibilita mais desdobramentos que o tempo de contribuição, exigindo um pouco mais de atenção do Advogado Previdenciarista, mas o domínio sobre ambos é imprescindível para uma boa atuação profissional.